por João Pedro Godoy

Precisamos falar sobre o protesto da torcida do Corinthians

Olá, amigo, amiga. Senta aqui. Assistiu ao Majestoso domingo? Mesmo que a resposta seja não, a gente precisa conversar sobre um fato ocorrido no clássico. Não, não foi a jogada patética do Lucão, nem a vitória e o tabu mantido pelo Corinthians na sua Arena contra um de seus maiores rivais. A questão é bem maior e transcende o futebol.

Explico: Aproximadamente na metade do segundo tempo, o árbitro Luiz Flávio de Oliveira interrompeu a partida. Chamou Felipe, capitão do Corinthians e indicou ao jogador o setor onde ficam as Torcidas Organizadas do Timão. No momento, pensei: “Sinalizadores de novo? A torcida não aprende mesmo…”. Logo depois, a informação: na realidade, eram faixas de protesto. “Contra o que?”, eu e provavelmente todos em casa se perguntavam. Enquanto isso, a imagem gerada pela TV Globo mostrava apenas o zagueiro Felipe pedindo para a torcida retirar as faixas. Instantaneamente, a curiosidade veio de saber o que de tão grave havia nas faixas, capazes de parar o clássico, fazer o capitão da equipe da casa pedir pela remoção e a TV que se orgulha de fazer uma transmissão completa, com lances até em 360 graus, não mostrar o conteúdo delas. Bem, aparentemente os chefes de transmissão se esquecem de que a Internet existe.Em questão de minutos, imagens das faixas já circulavam nas redes sociais. E, para o meu espanto, com dizeres pouco ou nada “ofensivos” para causar a reação do árbitro Luiz Flávio.

Exigir punição a pessoas corruptas, não gostar do monopólio do futebol que vemos hoje, pedir ingressos mais baratos e protestar contra entidades que comandam o futebol no país e no estado, são direitos do torcedor.Não havia nenhum xingamento ou palavras ofensivas nas quatro faixas exibidas. Os torcedores do Corinthians já haviam feito protesto semelhante na quinta-feira passada, contra o Capivariano e foram impedidos pela PM de São Paulo.

Esses dois protestos acontecem em uma semana recheada de manifestações contra a elitização do futebol também na Europa. Torcedores do Liverpool saíram do estádio mais cedo em um jogo válido pelo Campeonato Inglês, exibindo faixas e cartazes criticando severamente os donos do clube e a ganância ganhando da paixão no futebol, após saberem de preços abusivos na nova arquibancada que está sendo construída no Anfield. Tudo mostrado pela transmissão internacional, até banners com mensagens mais fortes de oposição. A diretoria do Liverpool recuou e desistiu de colocar as 77 libras reclamadas pelos torcedores. Alguns dias depois, foi a vez de torcedores do Borussia Dortmund jogarem bolinhas de tênis no campo, reclamando que o ingresso do futebol tinha preço de “esporte da elite”, como o tênis. Protesto mostrado pela TV e que causou reação mundial. Mais do que isso, o próprio clube soube da manifestação antes da partida e APOIOU a indignação de seus fãs.

Enquanto isso, aqui no Brasil…Preferem esconder a elitização dos estádios e censurar os protestos dos torcedores. O debate não é uma opção para quem monopoliza o futebol no país e manda e desmanda em horários de jogos, calendário de clubes e tabelas de campeonatos. Aqui, o árbitro prefere jogar pra debaixo do tapete os problemas da federação que ele carrega no uniforme e o jogador, seja por medo de represália ou por falta de senso coletivo mesmo, acata uma ordem descabida do comandante do apito. Aqui, a PM protege quem detém o poder, e não a população. É muito mais importante que futebol. É um retrato, mesmo que pequeno, de como a população brasileira é tratada como burra e manipulável pelos poderosos. Do governo, do futebol, da televisão. O que aconteceu no clássico não pode passar em branco. Cabe a nós, os incomodados, que sigamos mostrando nossa revolta. Quer queiram eles, quer não.

Comentários

comentário