Eu estava comentando com alguns amigos ainda agora que escrever essa crônica seria uma missão de Bradley Cooper, de Batman, de Superman ou até do Doutor Estranho. Como colocar em palavras uma história que está algumas linhas acima da fantástica fantasia do cinema, como recontar uma alucinação real? Não sei, queridos, mas eu vou tentar, bem como Billy Sianis tentou levar sua cabra a um jogo de baseball e deu início a isto tudo.

Começos malucos são as pedras fundamentais dos grandes causos, como diria meu avô. Era 1945, Billy comprou sua entrada para assistir à World Series, ou final do Baseball, pra ser mais brasileiro, e, como um bom vaqueiro, homem da roça, levou seu amigo, seu filho. De pelo. Foi ao jogo ao lado de sua Cabra de estimação, (ou Bode? Jamais saberemos), sentaram-se para aquele momento histórico na vida do torcedor que não via seu clube campeão há quase quarenta anos.

Como era um esporte um tanto setorizado em elites, em homens de bolsos mais rechonchudos, o choque em conviver com aquele animalzinho foi tamanho que a segurança do Wrigley Field, estádio dos Cubs, em Chicago, retirou a dupla do certame. Inconsolável, Billy teria rogado uma praga sobre seu clube do coração: “jamais vencerão a liga”. Digamos que o poder foi um tanto animal.

O famigerado Bode

O famigerado Bode

Os Cubs são aquele seu amigo que deu errado, sabe? Aquele cara que sempre caia de bicicleta na infância, que chegava na garota e tomava fora, que tirava a pior nota da sala, que pisava na bola naquele futebolzinho do intervalo, que chorava com tanto bullying. Era o cara baixinho de óculos fundo de garrafa, acima do peso e com sardas nas bochechas gorduchas. Exatamente como o cara que escreve este texto, exatamente como o Chicago Cubs.

Campeões da MLB em 1907 e 1908, os Cubs passaram 108 anos sendo esse carinha errado, sendo a piada, sendo o Corinthians até 2012, sendo o Palmeiras sem mundial, sendo o São Paulo sem Copa do Brasil, o Santos sem torcida. Sendo o tabu. Com bônus de alguns episódios em que o destino deu aquela gargalhada na cara dele, por exemplo, em 2003, quando um torcedor interferiu em um bola que saia do terreno de jogo, enquanto o time vencia o duelo pela vaga na World Series, iniciando a virada do rival e mais uma derrota do Chicago.

O lance ilegal

O lance ilegal

É tão clichê dizer que a vida imita a arte que eu só posso reafirmar a frase, dando uma adaptada necessária: a vida tira sarro da arte. No filme “Back to The Future 2”, de 1989, aquele filme do tênis branco de asas, lembram? Então, essa obra de arte tem uma cena em que é mostrado um telão com o anúncio dos Cubs como campeões de 2015. E foi quase. A vida, irônica, pensou e disse: “quase. Vai ser quase assim”. No ano passado, Chicago foi eliminado na semifinal, no último jogo antes da possível World Series. Mais uma vez, o menino tropeçou na hora de convidar a moça linda pra dançar. Quase

2016, Chicago Cubs faz a campanha mais eficiente da liga, faz uma série de playoffs com bastante consistência e atinge a final do Baseball, Chicago e World Series estavam, enfim, juntos. Até aí, a história já estava sendo linda, já traziam para o esporte alguns fãs novos, algumas pessoas que sequer sabiam que esporte era esse jogado com bastões e uma bola de madeira.

Iniciada a World Series, uma série de jogos que podem chegar a somar 7 duelos, teve, de cara, uma vantagem de 3 a 1 em favor do Cleveland Indians, time que não vencia a competição desde 1945, outra eternidade. Restava a Cleveland vencer um jogo e garantir a vitória. Aos Cubs, apenas vencer tudo. Ser perfeito. Não errar. Superar 108 anos de insucessos com uma tarefa de Batman, Superman, lembram? Pois é.

Nesse ano, o Cleveland Cavaliers, da NBA, conseguiu pela primeira vez na história vencer uma decisão saindo de uma situação de 3 a 1, igual ao que o Cubs enfrentaria. Vocês já sabem que o Cubs venceu. Vocês já sabem o que aconteceu. Não cabe a mim fazer mais linhas de mistério, mas cabe a mim fazer muitas linhas de exaltação. Os caras venceram dois jogos até empatarem e chegaram ao jogo 7, uma epopeia.

7 entradas, 6 a 4 no placar, um rebatedor pouco eficaz no bastão pelo Indians. Home Run, duas corridas e o empate. 9 entradas superadas, fomos a uma prorrogação, entradas extras. Bastaria? Não. Chuva. Jogo adiado. Retomado, e com duas corridas, Cubs campeão. CUBS CAMPEÃO DA MLB. Não, isso não era o filme. Isso é um apocalipse. Vou te explicar os vários porquês.

Repare em detalhes: na última eliminação dos Indians, todos os jogadores olhando incrédulos uns aos outros, comissão técnica chorando aos cântaros, rua ao lado do Wrigley Field em colapso, aquele momento que extrema alegria em que pessoas não sabem o que fazer. Uma sinestesia que arranca lágrima de qualquer cidadão. De mim, de vocês, do mundo. Imagens via Twitter de um senhor com seus pra lá de 80 anos levantando da cadeira com sofrimento, rindo auspiciosamente, quase que como um suspiro de vida, com alegria escorrendo do olhar senhoril. Mágica! Um homem que acompanhou a final ao lado da lápide de seu pai, cumprindo a promessa de verem juntos a este momento. Que se dane a biologia, as almas se unem por paixão, por esporte. E se há algo que podemos chamar de esporte e principalmente de alma e paixão, hoje, esse algo se chama Chicago Cubs, CAMPEÃO DA MLB!

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