Por João Gabriel Falcade

Até onde eu sabia, ainda quando garotinho, jogando PlayStation, o Corinthians era o time que menos ligava para o luxo que, a época, estava colocando as asas para dentro do mundo futebolístico. Eram torcedores que, diferente de mim, um Palmeirense chato, reclamão e consumidor de amendoim, não tinham prazer em protestar, tinham um acesso à sinergia que desafiava a lógica, era um povo por um time. Uma relação que se iniciava e encerrava dentro do próprio amor, alheio a qualquer problema. Indiferentes ao insucesso e motivadores da dor. Eram o oposto de mim. Admirava.

Cresci com essa imagem, me criei pro futebol vendo e tentando assimilar os porquês daqueles torcedores não brigarem com a derrota, porque cantavam o fracasso e exaltavam os fracassados. As derrotas vinham e o orgulho, teimoso e à imagem de seu interlocutor, ficava, se engrandecia e emanava. Que prazer dolorido de celebrar o sofrimento. Que bonito era. Que improvável era. Que Corinthians.

Calejado em sofrer, torcedor corinthiano é (ou foi?) conhecido por crescer nas derrotas

Calejado em sofrer, torcedor corinthiano é (ou foi?) conhecido por crescer nas derrotas

O tempo, senhor implacável de alterar o telhado de vidro do mundo, agiu, sorrateira e intensamente no povo que tinha um time e no time que tinha esse povo. Os sofrimentos, como um conta gotas de panaceia, começaram a inundar a vida desse mundo particular de competir. Vitórias, tabus, inseguranças, os poréns foram se esvaindo como dor remediada, desaparecendo em meio ao sucesso avassalador. Quem aprendera a sofrer tão constantemente viu-se livre de tão árdua tarefa. O mundo escreveu a glória em letras garrafais. Mas o torcedor parece estar analfabeto dessa nova grafia de vencer.

O Corinthiano de 2016, campeão de tudo, não se reconhece, não se encontra, não se entende, parece não se aceitar. Quando André, o camisa 9, entra para um jogo apalpado em murros verbais, sofrendo a represália cruel do pré-julgamento, ele prova que há uma cisão de identidade nesse povo tão fiel.

Onde estaria o incentivador dos piores do seu time, de quem recebia o carinho por ser incapaz de recebê-lo pela competência, mas o tinha pela compaixão. Onde estaria a essência Corinthians de ser torcedor?

Até onde eu sei, o Corinthians não reconhece aquele que o fez do mundo e para o mundo. Até onde eu sei!

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