Negro. Bom de bola. Joia Santista. Transferência ao Paris SG. Estamos falando de Neymar? Não.

Apesar das coincidências, Joel Camargo foi mais uma das brilhantes joias de Santos que se destacou e partiu para o velho continente. Diferente de Neymar, Joel era zagueiro, porém um dos melhores da sua geração na posição, além de ser o primeiro brasileiro a jogar no clube francês.

Diante da contratação mais cara da história do futebol – a de Neymar – esbanjando muito glamour, badalação, dinheiro, holofotes, onde jogadores são tratados como astros de rock’n roll, voltamos ao passado e relembramos que nem tudo sempre foi assim. E a história do zagueiro da Vila é um exemplo típico.

Com o apelido de Açucareiro, o beque possuía classe em campo. Abrilhantou a equipe de Pelé, junto ao Rei do Futebol, por quase uma década. Foi campeão com a Seleção Canarinho em 70, além de se tornar o primeiro de nosso país a trajar o uniforme do clube francês, que muito antes de Neymar, já teve outros brilhantes jogadores brasileiros, como Leonardo, Raí e Ronaldinho.

Também diferente de Neymar, Joel não teve holofotes apontados a ele em sua chegada à cidade de luz. E assim, sucessivamente, estendeu-se sua (oculta) trajetória. De titular de Saldanha, em 70, à reserva de Zagallo – sem sequer nem ter jogado um minuto na Copa – o zagueiro teve sua derrocada no ano do Tri Campeonato Mundial. Após a copa, Joel enfrentou diversos problemas, como um acidente fatal de carro envolvendo duas mulheres, com o jogador saindo com vida, porém gravemente ferido. Foram tempos difíceis. Joel passou quase seis meses em uma cama, além de enfrentar uma condenação de homicídio culposo por um ano e oito meses, em liberdade. De quebra, teve seu contrato com o Peixe rescindido.

Ferido não somente fisicamente, Joel amargurava o julgamento do público por ter supostamente dirigido bêbado na noite fatídica.

Foi então que o zagueiro tomou partido e levantou uma luta contra a imprensa, alegando racismo.

Joel foi um dos primeiros jogadores a levantar essa bandeira e defendê-la ferozmente, sendo muitas vezes chamado até de mascarado, como contado a Revista Placar, em 2014, antes de sua morte.

Desempregado, condenado e altamente criticado pela mídia brasileira, Joel esperou o tempo passar e em 1971 acertou sua ida ao Paris Saint-Germain, fundado recentemente no ano anterior.

Muito distante de ser o clube bilionário de Al-Khelaifi, o PSG acabara de subir de divisão e não detinha de astros e gigantes da bola, possuindo um nível técnico longe do que Joel apresentava.

O campeão do mundo fez um contrato de sete meses, e apesar de ser notadamente mais técnico que todos da equipe, Joel sofreu. Em sua estreia contra o Bordeaux, o zagueiro perdeu a cabeça e não conseguiu lidar com as adversidades de seus colegas em campo, gritando e criticando-os duramente. Isso foi o estopim para o técnico francês e todos que defendiam o clube, pois não aceitavam-se este tipo de comportamento em campo, diferente do que ocorria no Brasil, na época.

O contrato de sete meses difundiu-se em apenas três, fazendo com que ficasse à mercê de clubes pequenos na volta ao Brasil.

Por fim, Joel Camargo pendurou as chuteiras aos 29 anos, e seguiu sua vida em profunda boemia, fazendo com que aos 35 não tivesse mais nenhum dinheiro, sendo capaz de vender todas suas medalhas, inclusive a de campeão do mundo, em 70.

Sem dinheiro e com uma filha para criar, o ex-jogador teve que se virar e com a ajuda de seus irmãos, conseguiu um emprego no porto de Santos. Trabalho braçal. Onde Joel não era Joel, e sim, um orgulhoso, que por muitas vezes, quando perguntado se era o próprio, negava. Por orgulho e vergonha.

Mais uma vez, diferente de Neymar, Joel viveu seus últimos anos na orla santista, trabalhando até os 55 anos, e vivendo uma vida de feitos inglórios e sem holofotes…

 

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