Enquanto Federação enriquece, clubes do Interior precisam se virar sem dinheiro e apoio, mas contando com a paixão de seus torcedores.

A Federação Paulista de Futebol (FPF) é a maior federação estadual do futebol brasileiro. Possui 141 equipes profissionais filiadas, com 92 disputando alguma divisão de seus campeonatos e outras 49 licenciadas, sem condições de manter suas atividades. Além disso, é, de longe, a que tem o maior patrimônio entre as entidades estaduais, com um valor estimado em 25 bilhões de reais, segundo dados da Pluri Consultoria.

Ainda assim, muitos clubes filiados a esta rica federação passam por graves dificuldades financeiras, a ponto até de não conseguirem colocar um time em campo pra disputar campeonatos profissionais. O motivo? A falta de apoio da FPF e o descaso dela com os clubes.

Enquanto os clubes sofrem para botar um time em campo, os dirigentes da FPF comandam o futebol estadual neste belo prédio em São Paulo.

Enquanto os clubes sofrem para botar um time em campo, os dirigentes da FPF comandam o futebol estadual neste belo prédio em São Paulo.

Tudo é taxado pela federação: inscrição de jogadores, despesas de atletas que vêm de fora, gastos com seguro, arbitragem, impostos, ambulâncias, médico de plantão, policiamento, seguranças particulares, gandulas, taxa de testes de exames antidoping, cortesias para patrocinadores e credenciais de jornalistas. Sim, tudo isso deve ser pago pela equipe mandante das partidas. Exceção feita às equipes que disputam a quarta e última divisão do campeonato – mas que também recebem quantias mínimas de dinheiro, como falaremos mais pra frente.

O Noroeste, de Bauru, por exemplo, foi a equipe que levou mais torcedores ao seu estádio na Série A-3, mas ainda assim ficou no prejuízo em oito de seus nove jogos em casa. No total, 24 mil reais de déficit e apenas 500 reais de lucro na única partida em que conseguiu um superávit. Fora isso, a maior parte dos clubes do Interior paulista é particular e precisa pagar impostos, contas de energia, água e manutenção do estádio, além dos salários de seus funcionários e atletas.

A falta de apoio da federação aos clubes nas divisões menores é latente. “Nós recebemos apenas 80 mil reais para passar os quatro meses de competição na A-3. Não dá nem para o primeiro mês, com todas as despesas que temos. Assim, fica inviável de manter um clube de futebol”, disse Luciano Sato, dirigente do Noroeste de 2012 a 2015, em entrevista no ano passado.

Dirigente noroestino viveu as dificuldades de manter um clube pequeno com as contas em dia

Luciano Sato: Dirigente noroestino viveu as dificuldades de manter um clube pequeno com as contas em dia.

Tão inviável que alguns clubes se afastam do futebol profissional . Os casos mais emblemáticos ocorreram com o União São João, de Araras e XV de Jaú, duas tradicionais equipes do futebol interiorano. O primeiro foi o time que revelou o lateral-esquerdo Roberto Carlos ao futebol brasileiro, jogador campeão do mundo em 2002 e lenda do esporte, considerado um dos maiores da história em sua posição. O segundo ficou conhecido também por revelar grandes nomes e fazer grandes campanhas no cenário estadual. Ambos se encontram na última divisão do futebol paulista e pediram licenciamento do campeonato no ano passado. Neste ano, o União continuou fora, mas o XV se reestruturou e voltou ao cenário do futebol.

O time de Jaú voltou com tudo graças ao apoio de diversos patrocinadores, dirigentes competentes que souberam “arrumar a casa” e, principalmente, uma cidade que abraçou o XV após sentir o drama de perder seu time profissional, com um passado tão glorioso.  Nas três partidas em casa até agora, todas tiveram público acima dos três mil pagantes. No último jogo, contra a Internacional de Bebedouro, 5.381 pessoas estiveram no estádio Zezinho Magalhães para prestigiar a equipe, público maior do que em 9 das 20 partidas da primeira rodada do Campeonato Brasileiro das Séries A e B.

A volta do XV emociona tanto que torcedores viajam para assistir as partidas. É o caso de Matheus Bottura, nosso apaixonado pelo futebol do Interior aqui no Linha e que compareceu pela primeira vez ao Zezinho Magalhães no último domingo, saindo de Mineiros do Tietê. (Confira a odisseia de Matheus aqui). O jogo terminou em 1 a 1, mas o mau resultado do Galo da Comarca, como é conhecido o XV, não desanimou Matheus. O cara já esteve em semi-final de Copa do mundo e disse, em seu texto, palavras marcantes: “Aquele jogo da Copa não se equiparou ao do XV. Sério, o clima é outro. É bonito de ver o mar de camisas verdes e amarelas nos arredores do estádio. A quantidade de mulheres, crianças e idosos que ali estavam circulando. Tinha família, vendedor de churrasquinho, cambista e tudo mais que uma boa partida de futebol tem direito em um domingo de manhã”. Depois de ler isso, como pode a Federação que deveria cuidar do nosso futebol, deixá-lo às moscas? Como pode a FPF fingir que clubes como o XV de Jaú e União São João não importassem para o futebol estadual?

Olha a cara de feliz do nosso colaborador no Zezinho Magalhães. Como não amar o futebol do interior?

Olha a cara de feliz do nosso colaborador no Zezinho Magalhães. Como não amar o futebol do interior?

O futebol do Interior Paulista é viável, mas está sobrevivendo apenas da paixão e do dinheiro de empresários que conseguem ajudar os clubes. Quando isso não ocorre, uma federação omissa, que enriquece as custas de seus filiados, deixa as tradicionais equipes morrendo, sem pensar no patrimônio histórico-cultural que elas possuem. Não se esforça para mantê-las ajudando financeiramente ou organizando campeonatos mais atrativos e rentáveis. O Interior precisa ter voz para bradar contra a FPF e seus dirigentes com ideias ultrapassadas. Urgentemente.

 

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