Ele não tem o melhor elenco. Não conta com superestrelas. Não pode oferecer mega salários para ninguém e, até ontem, mal tinha seus desejos atendidos pela diretoria. Mesmo assim, com um ano e meio de trabalho, o treinador mais longevo do país soma um título e dois vice-campeonatos: um deles, o do Campeonato Brasileiro, que não acontecia há quase 10 anos. Um treinador assim é unanimidade dentro do clube, certo? Errado.

É a segunda passagem de Dorival Junior pelo Santos. Na primeira, em 2010, o time encantou o país com futebol bonito praticado e foi coroado com dois títulos: Paulista e Copa do Brasil do ano. Dorival dirigiu o peixe em 61 jogos e obteve 65% de aproveitamento antes da fatídica discussão com Neymar que culminou na demissão do comandante.

Cinco anos depois, Dorival Jr estava de volta ao Santos na 13ª rodada do Campeonato Brasileiro, assumindo uma equipe que visitava a zona do rebaixamento. Ele não tinha nas mãos Neymar, Ganso e Robinho, como em 2010, mas tinha jogadores rápidos na pontas e um camisa 10 em grande fase. Dorival fez daquele Santos uma máquina de contra-ataque. Geuvânio e Gabriel Barbosa disparavam para receber os lançamentos precisos de Lucas Lima. Ricardo Oliveira conferia para as redes e assim o Peixe chegou a final da Copa do Brasil e, por muito pouco, não se classificou para a Libertadores pelo Campeonato Brasileiro.

E foi aí que as críticas começaram. O planejamento mal feito de Dorival Jr tirou o Santos da zona do rebaixamento e colocou ‘apenas’ na sétima colocação. O ultrajante planejamento levou o Peixe a final da Copa do Brasil, perdida nos pênaltis. “Volta Luxa”, clamavam alguns. “Oswaldo de Oliveira não deveria ter sido demitido”, diziam outros. “Será que o Vagner Mancini não aceitaria voltar? ”, questionavam terceiros. “É hora de apostar no Guto Ferreira! ”, suplicavam outros ainda. E esses gritos não eram ouvidos nas arquibancadas: as palavras saíam da boca de conselheiros e pessoas influentes na Baixada.

 

As adaptações de Dorival

Dorival não se abalou com a potencial insegurança no cargo. Amparado pelo presidente Modesto Roma Jr, Dorival seguiu a frente da equipe e sofreu uma perda logo no começo da temporada: Geuvânio, peça chave do seu esquema de jogo. O empréstimo de Marquinhos Gabriel, que havia ganhado espaço com o treinador, terminou e o Peixe perdeu o atleta para o rival Corinthians. A reposição a altura foi chegar somente no final de junho: o colombiano Copete. Nesse meio tempo, Dorival teve que improvisar, transformando meias em pontas: Serginho, Vitor Bueno, Jean Mota (que também só chegou em junho) …

Sem o contra-ataque rápido, Dorival foi obrigado a se adaptar. Mudou o esquema de jogo da equipe para uma espécie de tiki-taka, aproveitando a técnica dos jogadores de meio-campo e laterais. O Peixe passou a dominar as ações e manter a posse da bola. Quando Dorival achou sua formação ideal com Vitor Bueno em grande fase, outro baque: Gabigol, Zeca e Thiago Maia convocados para as olimpíadas. Mais que isso, o Santos chegou a fazer jogos sem o trio e sem Ricardo Oliveira e Lucas Lima, convocados à seleção principal.

Sem um elenco de nome, Dorival usou o que tinha a disposição: jogadores promovidos da base. Caju substituiu Zeca e Leo Citadini ficou com a vaga de Thiago Maia; Copete, contratado a pedido do técnico, foi o substituto de Gabigol. Ainda durante a temporada, o Peixe perdeu sua dupla de zaga titular por lesão e teve de terminar o ano com Yuri, volante de origem, na zaga. Mesmo com tantas dificuldades na temporada, Dorival levou o caneco no Campeonato Paulista e foi vice-campeão brasileiro.

Em 2017, o Santos abriu os cofres e o técnico finalmente teve os pedidos atendidos. O zagueiro Cléber, o lateral Matheus Ribeiro, o volante Leandro Donizete, o ponta Vladimir Hernandez e os atacantes Kayke e Bruno Henrique custaram cerca de 24 milhões de reais e transformaram o elenco do Santos em um dos mais qualificados do país. Talvez pela primeira vez, o comandante do Peixe vai poder olhar para o banco de reservas e enxergar jogadores com capacidade de mudar a partida.

Depois de passar um ano e meio atirando com munição contada, precisando fazer valer cada bala gasta, Dorival Junior parece ter uma metralhadora em mãos. As taças estão na mira.

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