Zidane é desses seres humanos que parecem ter na cabeceira da cama um controle remoto da vida. Está ao alcance das mãos o comando irredutível das coisas que o cercam, dos planos da vida. Ele é desses que subvertem a ordem natural e para a vida tem um plano, sempre. Os mortais são descompassados pelo tempo, ficam à merce de qualquer vendaval de novidades. Zidane está sempre sentado no lado oposto, observando.

Assumir o Real Madrid B foi um passo de humildade muito bem calculado, coisa de camisa 10. É algo de sua índole ter a consciência e a resistência para começar por onde todos devem, mas poucos querem: o começo. Categorias menores em que sua posição de ídolo recém aposentado o credenciaria a emplacar quaisquer discursos que soassem necessários. Mais do que cones, traves, elásticos ou planos, Zidane tem ao seu lado o poder da palavra de quem faz e fez o que de melhor o futebol já viu.

Janeiro, naturalmente o rito dos astros de iniciar o ciclo, das estrelas engrenarem seus momentos, foi a passagem para o francês. Rafa Benítes deixava o time principal dos merengues a ele estendeu o tapete para o primeiro momento como técnico profissional. Lembram do plano? Evidentemente a humildade de começar vislumbrava esse passo no horizonte em que a ele coube a função de trazer rumo e direção a um enorme e bagunçado elenco de estrelas.

Foi como conduzir a bola da defesa ao ataque fatal em três ou quatro passos, um giro trezentos e sessenta por cima da bola, a cabeça levantada para um passe de precisão militar até os pés de qualquer um soldadinho de Zidane que a conduziria até as redes. Nesse novo cargo, conduziu a ele até uma fileira de taças. Não fosse bom o suficiente o bi-campeonato espanhol, carregou consigo uma glória que não guarda precedentes, tampouco terá sucessores.

Quinta-feira, 31/05/2018, coletiva no Real Madrid, o tri-campeão consecutivo da Champions League, o maior torneio do mundo. O clube treze vezes dono da orelhuda, o técnico que conduziu esse processo de reavivar na memória e no campo quem é o maior do planeta. Foi a despedida. Coisa de craque. Zidane comunicou em frases rápidas e simples que era a hora de terminar:

“Eu tomei a decisão de não continuar como técnico do Real Madrid, é um momento raro, mas esse time precisa de uma mudança para continuar ganhando, precisa de outro discurso, outra metodologia de trabalho e é por isso que tomei essa decisão”

Mestre nos discursos, também. Soube se sair à francesa, discreto, elegante, humilde e genial. Eterniza seu nome no panteão dos técnicos sem quaisquer riscos contra sua imagem. Termina reluzente, brilhante, sem margem de erro. Coisa de gênio. Zidane sai, o legado do ídolo, ainda em vida para assistir sua canonização, segue a todo vapor debaixo de seus olhos nada cansados e de sua mente tão brilhante.

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